"Nasceu rico, fez-se pobre"
O tema faz-nos lembrar a afirmação de São Paulo que diz:
“Jesus, embora fosse rico, se tornou pobre por causa de vocês, para com sua
pobreza enriquecer vocês” (2Cor 8,9). E Santo Antônio, conforme nos conta a
história, também nasceu de família rica. Seu pai Martinho de Bulhões, era
cavaleiro do Rei Afonso II de Portugal, e sua mãe, Maria Teresa Taveira,
aparentada com Failo I, o quarto rei das Astúrias. Seu avô, o conde Godofredo
de Bulhões foi o comandante da primeira cruzada, “guerra santa” dos cristãos
contra os maometanos que dominavam a Palestina, terra onde nasceu Jesus. Também
tinha um tio chamado Fernando de Bulhões que era cônego e diretor de uma escola
onde estudavam os filhos dos ricos, dos políticos e nobres. Nosso santo nasceu
em Lisboa no dia 15 de agosto de 1195. Recebeu na pia batismal, na catedral de Lisboa,
o nome de Fernando, que significa “ousado campeão da paz”. A casa onde nasceu
Santo Antônio fica ao oeste da Sé de Lisboa, muito perto do portal principal.
Certamente tinha outros irmãos. Entretanto somente temos conhecimento seguro de
uma irmã, chamada Maria e que morreu em 1235 no mosteiro de São Miguel em
Lisboa como cônega. Ela ainda vivia quando seu irmão, Santo Antônio, foi
canonizado em 30 de maio de 1232.
Logo cedo, Santo Antônio foi para a escola onde seu tio
era o diretor. Por ser filho do governador, vivia no luxo e na regalia, tinha
tudo para buscar a vida e o ideal dos ricos de seu tempo. Mas quando Deus
escolhe e chama alguém, não se pode fugir de seu caminho, e Santo Antônio fugiu
foi da riqueza, da politicagem, da mentira e bajulação e buscou a felicidade
bem longe de tudo isso. Certo dia, já rapazinho, assim desabafou:
“Ó mundo! Como você é um peso para mim!
O seu poder é nada!
Você não passa de uma varinha fraca.
As suas riquezas são como uma baforada de fumaça, e os
seus prazeres como uma pedra traiçoeira, na qual a coragem de um homem de bem
se afunda”.
“Acolheu com alegria a sabedoria da Palavra de Deus”
Em Lisboa, o rei de Portugal Dom Afonso I mandou
construir um mosteiro e deu o nome de São Vicente de Fora. Queria que aquele
lugar marcasse a vitória dos portugueses contra os seguidores de Maomé, que
quiseram tomar Portugal. Nessa guerra contra os maometanos, o avó de Santo
Antônio foi muito importante.
Para tomar conta do mosteiro, que ficava fora da cidade
de Lisboa, o Rei convidou os religiosos chamados Agostinianos, que já tinham um
mosteiro em Coimbra, o de Santa Cruz. Os Agostinianos eram muito estudados,
possuíam terras e se relacionavam muito bem com os nobres, ricos e letrados da
região.
Foi para o mosteiro de São Vicente de Fora que Santo
Antônio entra para a vida religiosa, em 1210, com a idade de 15 anos. Sofreu a
resistência de seus pais e parentes que queriam que seguisse uma outra carreira
mais vantajosa de glórias, poder e riqueza, mas nosso santo tinha escutado o
chamado de Deus e manteve-se firme em sua decisão.
Mas a vida para Antônio no mosteiro foi difícil,
sobretudo porque seus parentes queriam interferir demais, oferecendo-lhe
facilidades e conseqüentemente o interesse dos cônegos em manter um
relacionamento social estreito com nobres e ricos incomodavam a Antônio. Ele
queria uma vida que correspondesse às exigências do Evangelho.
Assim, dois anos mais tarde, em 1212, foi transferido
para o mosteiro de Santa Cruz e lá encontrou ambiente propício para seu
crescimento humano e espiritual. Dos Sermões que nos deixou, pode-se concluir
que Antônio aproveitou intensamente as possibilidades de estudo que lhe foram
oferecidas em Coimbra. Possuidor de uma memória extraordinária dedicou-se em
especial ao estudo das Sagradas Escrituras, encontrando para isso mestres
dedicados e um mosteiro com uma biblioteca bem provida, possuindo também as
obras de Santo Agostinho, que inspirava a vida dos cônegos agostinianos.
Nosso santo fez das Escrituras aquilo que o salmista já
afirmara: “Tua Palavra é luz para os meus passos”. Nas Escrituras encontrou a
verdadeira sabedoria que está na vida de Jesus Cristo que “é poder de Deus e
sabedoria de Deus” (1Cor 1,24).
“Partiu para os desafios do mundo”
Não se pode negar a importância que teve para Antônio a
passagem pelos mosteiros dos agostinianos, tanto em Lisboa quanto em Coimbra.
Dificuldades não faltaram, mas também as oportunidades para uma formação
espiritual e teológica que o firmaram na fé e no amadurecimento para futuras
decisões são inegáveis. E o nosso santo tem consciência disso e sabe ser
agradecido àqueles que o ajudaram a percorrer esse caminho. Mas a vida no
mosteiro de Santa Cruz estava limitada demais para alguém que se caracteriza
pela “inquietação evangélica”. E essa inquietação aumenta quando chega a
Portugal, no ano de 1217, o sopro renovador e missionário do movimento
religioso iniciado por Francisco de Assis, e que nem tinha dez anos de
existência. Os franciscanos estavam presentes em Coimbra e em Lisboa.
O modo de vida, marcado pela pobreza, simplicidade e
proximidade do povo marcava a presença dos irmãos menores. Dois anos mais
tarde, em 1919, São Francisco enviou em missão entre os maometanos cinco
frades, Berardo, Pedro, Oto, Adjuto e Acúrsio. Foram anunciar o evangelho entre
os sarracenos em Servilha, Espanha, dominada por eles. Lá foram condenados à
morte, mas receberam indulto de liberdade e expulsos do país. Mas insistentes
foram para o Marrocos e lá sofreram o martírio, sendo decapitados no dia 16 de
janeiro de 1220. Seus corpos foram levados para Portugal e sepultados no
mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, onde morava Santo Antônio.
O testemunho dos frades mártires e a proposta de vida
evangélica lançada por Francisco de Assis a toda a Igreja, mexeu com Antônio
que pediu para sair do mosteiro e ir para o Ordem dos Frades Menores. Foi
difícil receber a autorização do superior mas Antônio conseguiu. Diz-se que um
dos cônegos despediu-se de Antonio dizendo, certamente com ironia: “Vai, pois,
vai, agora podes enfim tornar-te santo!” Também dizem que Antônio respondeu:
“Se acaso ouvires alguma vez que eu me tornei santo, então louva o Senhor
Deus”. Tinha razão, Antônio será o “santo do mundo inteiro” e vai se santificar
no contato diário com as pessoas, ajudando-as a encontrar em Deus o sentido
para viver e para enfrentar os desafios da vida. A vida de Antônio não foi
fácil, mas jamais procurou as facilidades deste mundo, sabia que o caminho do
Senhor é estreito e é nele que caminhamos para a verdadeira felicidade.
“Firmou-se na virtude da humildade”
Foi em 1220 que Fernando saiu do mosteiro agostiniano e
entrou na Ordem franciscana. E como o conventinho dos frades em Coimbra tinha
como padroeiro o eremita Santo Antão, foi esse o nome que Fernando recebeu
agora como frade menor: Antônio. O costume de mudar o nome tem fundamento
bíblico e quer significar começo de uma nova vida, com uma nova identidade.
Logo Antonio manifestou o desejo de ser missionário no Marrocos, mostrando
assim que o exemplo dos cinco mártires franciscanos marcou profundamente a sua
vida.
Pelo fim de 1220 recebeu a licença de seus superiores e
partiu para o Marrocos em companhia de outro frade de nome Filipe. Chegou ao
Marrocos, mas adoeceu de uma doença febril por um longo período no ano de 1221.
Foi aconselhado a voltar para a terra natal e na viagem de regresso, mesmo não
sendo tempo de tempestades, um forte vento arrastou o barco para a costa da
Sicília, Itália, ao invés de ir para Espanha ou Portugal.
Acolhido pelos frades em Messina, na Sicília, foi
compreendendo os caminhos misteriosos da vontade de Deus e humildemente
submetendo-se à Sua vontade.
No fim de maio de 1221, Antônio participou do Capítulo
geral da Ordem, em Assis, vindo a conhecer São Francisco. Após o Capitulo,
Antônio é designado para morar no norte da Itália. No conventinho de Monte
Paolo, viveu uma vida de recolhimento e também assumiu as tarefas de lavar a
louça e limpar o chão.
Neste contexto de vida de oração e trabalhos humildes é
convocado para receber a ordenação sacerdotal, em 1222. E é justamente na festa
de ordenação, na hora da refeição festiva que é convocado pelo superior para
fazer uma pregação improvisada. Sua pregação impressionou a todos e a partir
daí, foi designado para a atividade do apostolado e da pregação.
Antônio experimenta na própria pele a palavra do Senhor
no Evangelho: “Quem se eleva será humilhado, e quem se humilha será exaltado”
(Lc 14,11).
Para quem pretendia ser mártir no Marrocos e teve de
tomar caminhos tão diversos, entende que a vontade de Deus só pode ser
compreendida pelos humildes. Daí dizer que “a humildade é a mãe e a raiz de
todas as virtudes”.
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